Adianta?
Leonardo Melgarejo – ambientalista e colaborador da Rede Democracia
As imagens da guerra veiculadas esta semana não permitem dúvidas: quando os perseguidos se revoltam, e os poderosos ameaçados com aquilo não encontram limitações ao impulso de mostrar do que são capazes, a possibilidade de construção de um futuro saudável em sociedades amistosas se reduz a pó.
Mais do que triste, chega a ser patético ver comentaristas de TV passando de homens sérios e frases como “são animais e vamos tratá-los como tal”, para festejos do dia das crianças, com mulheres alegres, descrevendo bem-sucedidas coletas/distribuições do pouco que basta para alimentar alegrias em espaços onde as dificuldades são maiores do que as nossas. Há mérito nisso, com certeza. É algo que deve ser aplaudido, estimulado, ainda que neste formato, no qual não se questiona o fato de que o cuidado com TODAS as crianças jamais deveria ficar restrito a determinadas datas. No entanto, assim o fazemos ser. E convenhamos, com todos os benefícios que carrega, esta forma de fazer o bem não parece exercer contágios, nem tem o poder ou mesmo o objetivo de contribuir para alteração nas trajetórias de vida impostas àquelas crianças que pouco ou nada têm. Ainda assim, elas brilham a ponto de transferir luz para quem com elas contribua. E todos sabemos que – se apoiadas – aquelas crianças poderiam ser a base de um mundo melhor do que o nosso. Neste sentido, é triste perceber que há certa semelhança entre o pouco que conseguimos naqueles esforços para alegrar o dia de crianças que desconhecemos e os resultados de combate a seca, que fazemos poupando a água do banho, ao mesmo tempo em que elegemos bancadas de apoio ao agronegócio que a contamina e desperdiça.
Mas enfim, nestes dias de contraste entre o que se oferece para crianças discriminadas pela sorte, pelo sangue, pela cor ou pela geografia (coisas que variam de bombons e balas a bombas e mísseis), resta evidente de que pautarmos nossas vidas pelo mérito de algumas ações já não basta. É preciso ter consciência dos impactos de nossas omissões. Do que elas provocam e a respeito de sobre quem recairão suas consequências. Porque em tudo há semeadura e elas trarão colheitas. Assim como gentileza gera gentileza, o sofrimento acalenta o caos.
E penso nisso, nesta segunda semana de outubro, semana da criança. Avança o sinal do pior, na contradição entre o sorriso das crianças, a passividade da maioria e a fúria desembestada de adultos que comandam a erosão vital deste planeta inviabilizado pelo que estamos aceitando como se fosse um caminho para o desenvolvimento.
Sinais do pior, sim. Afinal, o que pode resultar do massacre que a reação de Israel ao que as grandes mídias chamam de “terrorismo”, desatou, senão o pipocar de tragédias em outro patamar e em todos os locais do planeta?
E o que esperar disso, que virá, senão o recrudescimento do fascismo, com mais violências e mais crianças sendo recrutadas para o ódio e para o massacre?
Neste texto, não há como recomendar músicas, mas Chico cantou que quem semeia vento, como nós, colherá tempestades (Bom conselho, Chico Buarque, 1973).
Ouça um bom conselho, que eu lhe dou de graça
Inútil dormir que a dor não passa
Espere sentado, ou você se cansa
Está provado, quem espera nunca alcança (…)
Eu semeio o vento na minha cidade
Vou pra rua e bebo a tempestade
Para finalizar, recomendo uma olhada e uma escuta atenta para a clareza, lucidez e a coragem desta que, a meu ver, é a mulher mais necessária que minha terra, o Alegrete, já produziu. Me perdoem as demais companheiras alegretenses, mas sei que hão de entender a importância de um fato simples. Fernanda Melchiona ainda está a meio caminho e já fala por 200 mil gaúchos (votos para Deputada Federal – PSOL/RS) e sabe-se lá quantos outros brasileiros e brasileiras. Do conjunto de suas falas no programa Arte, Ciência e Ética (Programa quinzenal do Canal Brasil de Fato) destaco sua preocupação com tendência de privatização dos presídios, o novo mercado que se abre para que alguém lucre com o encarceramento de vários. E sabemos quem serão estes: as crianças desvalidas de hoje, os discriminados, os pretos, os pobres. Os que nasceram sob o signo da desigualdade, os que entre nós se assemelham, na opinião daquele general, aos “animais humanos” da faixa de gaza.
Elizabeth Maria Costa de Oliveira
15/10/23 @ 09:02
Excelente texto,fala de todos os horrores da atualidade e cita o horror vivido pelos palestinos, sem dizer que acontece desde1967, que foi potencializado há 17 anos e que hoje está em curso um Genocídio em Gaza realizado pelo Estado de Israel com cumplicidade dos EUA, Inglaterra e parte da União Europeia, da mídia convencional e o silêncio de alguns movimentos que defendem a Democracia e os Direitos Humanos.